sexta-feira, 28 de março de 2014

O argumento Cosmológico

Um dos mais poderosos argumentos para a existência de Deus é o chamado argumento cosmológico. Podemos dizer que existem dois tipos de argumentos cosmológicos: o argumento Kalam (baseado no princípio do Universo) e o argumento da contingência. É sobre o segundo que cai hoje a nossa atenção, e na minha opinião, de ambos é claramente também o mais poderoso.
Primeiro comecemos por definir alguns conceitos chave: contingente e necessário. Dizemos que um ser/entidade é contingente se é possível que esse ser não existisse, praticamente tudo o que conhecemos existe desta maneira: pessoas, montanhas, animais, etc. são exemplos de seres que poderiam certamente não ter existido (a sua não existência é logicamente possível). Dizemos, na linguagem de mundos possíveis (maneiras que a realidade poderia ter sido), que x é contingente se e somente se existe um mundo possível onde x não existe e x existe no mundo real. Um ser que não seja contingente (existe em todos os mundos possíveis) é necessário. Para aqueles que consideram que objectos matemáticos como números e conjuntos existem, é considerado que tais objectos existem desta maneira.
O filósofo e matemático Leibnitz, postulou um princípio chamado princípio da razão suficiente, que embora na sua forma original seja demasiado forte, uma versão enfraquecida é tudo o que precisamos:

(PRS) Todo o ser que existe tem uma explicação para a sua existência: na necessidade da sua própria natureza, ou numa entidade externa. 


Gottfried Wilhelm Leibniz, criador do cálculo diferencial, filósofo Cristão e defensor do argumento Cosmológico

Este princípio parece obviamente verdadeiro, na realidade toda a ciência se baseia nele, pois na ciência o que tentamos sempre fazer é, quando deparados com a existência de algo, explicar qual foi a sua causa. Imagine só a seguinte caricata situação: dois cientistas fazem experiências num laboratório, e um deles detecta a presença de uma certa bactéria no substrato que estão a analisar, quando questiona o seu colega sobre a explicação para a existência de tal bactéria, o seu colega apenas lhe responde: "não te preocupes, existe inexplicavelmente!". A negação deste princípio destruiria o método científico e parece também metafisicamente absurda, pelo que devemos aceitar este princípio como consideravelmente mais plausível que a sua negação.

Se um ser existe de forma contingente, então a explicação para a sua existência não pode residir na sua própria natureza, pois tal implicaria que este mesmo ser seria necessariamente existente, tal como números ou outros objectos abstractos, que pela sua própria definição se pode inferir que a sua não existência leva a cenários metafisicamente absurdos. Destas considerações nasce a premissa 1 do nosso argumento, que se formula da seguinte forma:

1. Todo o ser contingente que existe, tem uma explicação externa para a sua existência.
2. O Universo existe e é contingente.
Conclusão: O Universo tem uma explicação externa para a sua existência.

É óbvio que o Universo existe, e já vimos no início desta discussão a razão pela qual a realidade física é contingente. Este facto é mesmo comprovado pela física moderna, que nos indica que poderíamos ter tido outro Universo com características completamente diferentes, e mesmo a ausência de espaço e tempo. 

Chegando à conclusão de que o Universo tem uma explicação externa para a sua existência (pois nada dependente do Universo poderia causar a existência do Universo), podemos inferir as seguintes propriedades da entidade que explica o Universo:

  • É atemporal, pois a dimensão do tempo depende do Universo para a sua existência.
  • É não espacial, pois a dimensão do espaço depende do Universo para a sua existência.
  • É imaterial, pois toda a matéria necessariamente existe dentro do espaço.É poderosa, pois causou o Universo.
  • Existe necessariamente, pois se for contingente também ela exige uma causa, e o processo continua ad infinitum, então princípios como a Navalha de Occams e a absurdidade de infinitos reais tornam essa opção não viável.
Finalmente podemos inferir que é um agente pessoal. Em primeiro lugar, se a causa para o Universo é apenas um conjunto de condições suficientes para a existência do Universo, o Universo teria de existir sempre que a causa existe, mas a causa existe necessariamente, o que significa que o Universo existiria também ele necessariamente, o que contradiz a premissa 2, percebemos assim que a causa é um agente com livre-arbítrio, que pode ou não criar o Universo. Em segundo lugar, dadas as quatro propriedades acima da causa, apenas nos restam entidades como objectos abstractos como números e mentes, mas objectos abstractos não podem causar nada (isso faz parte da definição de ser abstracto), pelo que apenas restam mentes como o único candidato. 

Podemos então, como base no que foi dito, concluir que existe uma mente atemporal, não espacial, imaterial, necessariamente existente, que criou o Universo, a esta mente chamamos simplesmente, Deus.



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